Saturday, January 28, 2006

se este fosse o último dia
e o teu corpo o soubesse
seria a tranquilidade possível
ou correrias pelas ruas
o grito que trazes preso
nos braços nos olhos na pele

se este fosse o último dia
do que julgas inútil
ainda assim terias frio

quando o sangue se derramar
nos nossos olhos assustados
brancos abertos na luz
do primeiro dia da nossa separação
quando o sangue se derramar
quente expesso impossível
de estancar na carne
da primeira hora de tu não estares
da primeira hora de eu me ter
afastado em passos decisivos
céleres irrepetíveis
quando o sangue que se derrama
em nós neste milagre
do primeiro dia do nosso encontro
não for mais que uma côr
um cheiro uma hora um passo
de um qualquer dia banal
sem círculo marcando a memória

guardarei ainda num lugar
profundo em mim
o sabor do teu sangue
colado à minha boca

Friday, January 27, 2006

II - (à passagem para outro sítio)

os filhos são árvores
de mistério
no jardim dos pais
cantam tão livres
presos à terra
da casa dos pais
balançam no vento
perante os olhos
espantados e confusos
dos pais que os julgam
seus enigmas

Thursday, January 26, 2006

os filhos são árvores
misteriosas
no jardim dos pais
cantam e e passeiam
presos à terra
da casa dos pais
não dobram com o vento
apenas daçam
obedientes
perante os olhos
espantados e confusos
dos pais que os querem
inutilmente decifrar

Wednesday, January 25, 2006

planto uma flor
no teu cabelo
liso negro jovem
mulher de olhos rasos
de brilho

cheiras a pele onde
enterrar os dentes
os lábios a língua

assomo a mão
ao toque no teu
corpo desejo
ao toque do teu corpo
assomo o medo
a idade a raiz
o animal absurdo

Friday, January 20, 2006

crap, and you know it.

Wednesday, January 11, 2006

o mais
curto
e profundo
poema

silêncio

do comboio
são as árvores
que correm

mãe

Monday, January 09, 2006

a cidade é um bicho nocturno
percorremos tantas ruas
tantas esquinas e paredes
a cidade é uma amiga uma mulher
que sorri ao fracasso de cada dia
pelo chão ecoam os nossos passos
como música que trauteamos embriagados
na cidade só se deve viver de noite
como nos corpos das mulheres da avenida

vi hoje
o tremor
da idade
nas tuas mãos


morrerás
é certo

Friday, January 06, 2006

um dia próximo breve
vou escrever-te uma canção
para gritares quando corres na noite
acordado pelo medo antigo
e pelo frio e pelo azul intenso
dos olhos da solidão
muito abertos nas paredes
serão palavras agudas
estridentes como facas

um dia próximo breve
vou escolher palavras que
inundem o teu corpo de luz
palavras exactas que te afastem
das janelas com vista para os dias de guerra
e sangue e gritos nas manhãs
brancas da morte dos teus amigos



mas tu sabes
mais que a vida
são as palavras que nos fogem

Thursday, January 05, 2006

de tanto chorarmos a rir
chegámos a chorar lágrimas
de tristeza pura - meu amor
que tudo em ti tinha a pureza
das mulheres que não se escondem
das manhãs de sol em meses
gélidos de inverno do cheiro da terra
depois das primeiras chuvas torrenciais
meu amor - eras transparente
trazias sempre o coração
nas mãos e os que te amavam
receavam por ti e não sabiam
que os teus olhos tinham
pouco tempo para amar
por isso não podias ser razoável
nunca te entregaste aos poucos
a pensar no futuro que
soubemos depois não tinhas
será banal dizer que foste mar
e corpo aberto na areia
nenhuma palavra te será justa
em nenhuma palavra estará
o teu riso amado